As lavouras de café no Estado de Rondônia estão propiciando, em 15 municípios, emprego e renda a 17 mil famílias, inclusive indígenas, sem destruir a Floresta Amazônica. De acordo com estudo elaborado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Embrapa, durante a última década, a área dedicada ao cultivo do fruto diminuiu e a produção aumentou.
Em 2011, os rondonienses dedicavam 318 mil hectares de suas lavouras ao café e produziam 1,9 milhão de sacas. A expectativa de produção para a safra deste ano é superior a 2,3 milhões de sacas, em uma área plantada 78% inferior à de 2001, com 71 mil hectares.
Se dilatar o intervalo de tempo, o ganho da produtividade impressiona ainda mais. Em 2001, a média de eram oito sacas por hectare. Hoje o rendimento médio é 36 sacas por hectare, crescimento de 400%. Conforme Enrique Alves, autor do estudo e pesquisador da Embrapa em Rondônia, há lavouras produzindo até 180 sacas por hectare.
Ciência, tecnologia e o propósito de produzir sem destruir a floresta estão por trás desses resultados. O café chegou em Rondônia na década de 1970 trazido por colonos do Espírito Santo, Minas Gerais e Paraná. A demarcação de terras indígenas, conforme previsto na Constituição Federal (1988), devolveu áreas aos índios que se reinstalaram em territórios onde havia café plantado. Os indígenas não estenderam as áreas desmatadas e mantiveram o cultivo do café.
Inovações
A cultura do café em Rondônia evoluiu com o tempo e apoio da Embrapa. A pesquisa aplicada melhorou genética e permitiu a adoção de novas técnicas para preparar o solo, distribuir as plantas na lavoura, fazer irrigação e a poda das plantas.
No estado, a produção de café é favorecida pela umidade e temperaturas altas. Além disso, há lavouras integradas a matas, em ambiente mais arborizado, o que cria microclima que modifica o desenvolvimento das plantas.
O manejo da colheita, que na região começa em abril e pode ir até agosto, também foi aperfeiçoado para tentar mais uniformização de crescimento e a colheita simultânea de o máximo de frutos maduros. Para o pós-colheita, se desenvolveram novas técnicas para secagem, solar ou mecânica, em temperatura alta (35 a 45 graus centigrados). Nova rotina de armazenamento foi adotada para evitar fungos.
O pesquisador Enrique Alves se orgulha das técnicas desenvolvidas e dos resultados atingidos. Ele também opina que o café de Rondônia viceja futuro melhor a quem trabalha na lavoura. “O café é amigo da floresta. Onde tem café tem mata”, assinala. Segundo ele, a preservação do meio ambiente e os ganhos de produtividade agregam valor ao café. “Quando tem agregação de valor, é maior renda para quem produz e menor a necessidade de grandes áreas para a atividade.”
“Se existe uma região no globo terrestre que pode aumentar vertiginosamente a sua produção de café, sem que seja necessário um único hectare de desmatamento, ela está no Estado de Rondônia”, escreveu o pesquisador no estudo divulgado pela Embrapa.
Indicação geográfica
Enquanto aguardam o lançamento de um novo pó de café por uma das maiores marcas do país, os produtores de Rondônia trabalham para que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), ligado ao Ministério da Economia, reconheça as “Matas de Rondônia” como indicação geográfica de procedência e da maneira de produzir café.
Caso isso ocorra, será a sétima região do pais a ter o reconhecimento – após o “Cerrado Mineiro”, “Mantiqueira de Minas”; “Alta Mogiana”, “Região de Pinhal”, “Oeste da Bahia” e “Norte Pioneiro do Paraná”. Rondônia é o maior produtor de café na Amazônia e é o quinto em produção nacional – após Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo e Bahia.
O café cultivado em Rondônia é o do tipo robusta (canéfora). O café é muito procurado pela indústria cafeeira para compor com o café arábica, que é mais produzido no Brasil. O café robusta complementa o arábica, mais doce, e propicia mais corpo à bebida, além de acrescentar mais cafeína.
“Eu digo sempre que o arábica é bossa nova, e o robusta é rock’n roll”, explica Enrique Alves.
Além de baratear custos de blends e de solúveis, quando há mistura dos tipos de café cria-se efeitos que agradam o paladar, como a formação de crema no café tirado em máquinas de espresso.
O pesquisador assinala que os produtores de Rondônia trabalham para que o café robusta entre também no mercado de cafés especiais dentro e fora do país. Para isso, adotaram a torra do café entre o ponto claro e médio, e incorporaram novos processos de fermentação na preparação dos grãos. “O café fino robusta é bastante equilibrado, tem doçura e acidez. Preenche a boca de forma mais aveludada.”
Renda em vez de desmatamento
Por ser produzido na Floresta Amazônica, inclusive por indígenas, e por favorecer a preservação ambiental, o café de Rondônia tem apelo comercial do “consumo engajado”, crê Alves. “A Europa faz muito isso. É uma forma de preservação. Aprender a valorizar isso é salvar a agricultura familiar. Quem ama florestas, consome cafés sustentáveis.”
Estimativa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) é de que em 2019 mais de 1,2 mil quilômetros quadrados tenham sido desmatados. O dado é gerado a partir da análise de imagens de satélite (Lamdsat) pelo Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes).
O desmatamento de Rondônia contribuiu com 12% da destruição da floresta na Amazônia Legal, o estado ocupa uma área inferior a 5% dessa região. No ano passado, fiscais do Ibama relataram problemas de roubo de madeira na Floresta Nacional do Jamari e o crescimento do desmatamento em 455% no município de Cujubim. Em Espigão d’Oeste os alertas de desmatamento cresceram em 332%.
O desmatamento ilegal e os focos de incêndios em Rondônia são monitorados desde abril pelo Comando Conjunto Príncipe da Beira, sob orientação do Ministério da Defesa, em articulação com Ibama, ICMBio, Força Nacional de Segurança Pública, Agência Brasileira de Inteligência e Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam).
O pesquisador Enrique Alves é enfático ao dizer que a cultura de café em Rondônia evita o desmatamento. “Nas regiões onde ocorrem as queimadas estão fazendo abertura de área para pastagem, soja ou outra cultura. Se nessas regiões tivesse café gerando renda, possivelmente esse tipo de atividade seria muito menor.”
Agência Brasil