A quem ainda não é familiarizado com o termo que pipocou na redes sociais aqui em Campo Grande ontem (06), “blackface” é o nome dado para a caracterização de personagens do teatro com estereótipos racistas atribuídos aos negros. Na tradução literal do inglês, blackface significa “rosto negro”. Por aqui, o termo resumiu as criticas contra a maquiadora Priscilla Lessa, que transformou em negras modelos de pele mais clara e de traços europeus, como o nariz mais fino.
As postagens contra o trabalho começaram no “stories” do Instagram da modelo Ethyene Karen, questionando o porquê de Priscilla ter usado tons de base mais escuros em uma modelo com bem menos “melaninada” se existem tantas outras negras de pele bem mais escura dispostas a modelarem para esses profissionais. Nas imagens, ela traz fotos das modelos ao natural e depois da maquiagem.
“Desde que me tornei modelo de maquiagem o que mais ouço é ‘difícil achar modelos negras em Campo Grande, não tem’. Será que não tem mesmo? Será que chegou a abrir a pergunta nas redes sociais e esperou pra ver indicações?”, perguntou ela na rede social.
Ao conversar com Ethyene, o Lado B ouviu a revolta da estudante em relação ao caso, que fez até com que Priscila desativasse o próprio Instagram profissional.
“Elas já foram maquiadas anteriormente por ela, são duas modelos, uma de pele mais escura e a outra de pele mais clara. O que aconteceu foi que utilizaram uma base número 50 para falar que faz pele escura. Eu fico triste porque existe essa cultura de que não existe modelo negra, mas elas nunca são chamadas para quase nenhum trabalho. Eu conheço uma mulher angolana, de pele preta, que quase não é chamada pra nada, por exemplo”.
Catarina Gomes era a modelo de pele mais clara e, segundo ela, as montagens feitas não a representam a realidade. “Pegaram uma foto do meu Instagram na qual eu estava bem mais clara do que na foto da Pri. Eu tirei essa foto do meu aparelho celular, que não tem a mesma qualidade da câmera da maquiadora, com o raio de sol vindo diretamente em mim. Quem me conhece sabe que eu não sou daquela cor”, diz.
Ainda de acordo com a jovem, ela foi contratada não por ser negra, mas por ter olhos grandes. “Era essa a intenção da maquiagem, mostrar os detalhes do olho. Ela usa uma base mais escura no mesmo tom que eu uso em casa para me maquiar porque sei que se eu passo um tom idêntico ao da minha pele estoura no flash da foto. Só que a diferença é que a minha base é nacional, da Tracta, a dela é internacional e muito mais pigmentada”.
Ethyene rebate, mas ameniza. “É mais uma questão de comodidade. Ela já tinha o contato delas e por isso deve ter ligado de novo para as duas. O problema foi que ela não pensou que poderia encontrar modelos que se encaixassem mais na proposta do que ela apresentou”.
Para ela, a temática racial está em alta e sendo cada vez mais abordada, por isso é tão improtante se posicionar e valorizar os traços reais. “Eu ouço as pessoas dizerem que ‘meninas negras não vem muito nesse salão’, por que será? Você tem produtos para cabelos crespos e cacheados? Seus editais incluem modelos negras? Seus penteados são apenas para cabelos lisos? Campo Grande é racista, hostil e está cheia de profissionais da área de beleza acomodadas indo atrás apenas de modelos brancas”.
Priscilla ainda chegou a publicar stories no qual explicava o motivo de ter subido dois tons de base. ”Pra não estourar no flash e para fazer os contornos. Ninguém ensinou isso a vocês?”.
Tentamos entrar em contato com a profissional, mas ela não atendeu as ligações. De acordo com o namorado da maquiadora, ”ela apenas não quer se pronunciar, está muito abalada com a situação”.
Ainda ontem, Priscila desativou o Instagram de mais de 366 mil seguidores por tempo indeterminado.
Campo Grande News