Uma mãe que lutou e continuará lutando com as “sementinhas” deixada pela filha, como a costureira Judite Amorim, de 65 anos mesmo disse. Dois dias após descobrir o paradeiro da jovem de 21 anos e saber que ela havia sido decapitada, em Campo Grande, a mãe conversou com o G1 e contou um pouco do drama de quem convive com um usuário de drogas.
“Eu e o meu marido ainda estamos muito abalados. Não tenho muito o que dizer, ela era fechada neste mundo particular dela. Eu só sei que lutei muito e conversava com ela todos os dias, todos os dias. Estava fazendo campanha na igreja, pedindo para ela continuar bem em casa. Mesmo assim, senti algo estranho acontecendo há duas semanas. Ela, que era carinhosa e me abraçava, estava gritando, ríspida com as crianças e também tomava água sem parar”, afirmou a mãe.
Entre indas e vindas, Joice Viana Amorim estava morando com a D. Judite há 2 anos e 4 meses. “Antes, ela ficou fora por cerca de 5 meses. Apenas me ligou e disse que estava morando em Prudente, no interior de São Paulo. Tempos depois, falou que conseguiu carona e então se mudou para Maringá, no Paraná. Neste momento, me bateu um desespero porque ficou muito longe para ir visitá-la e eu pedi sem parar para ela voltar pra casa. Quando voltou, descobriu aqui que estava grávida de quatro meses”, relembrou.
Em casa, a mãe disse que passou a cuidar muito da jovem, levando ela no médico e dando toda a assistência necessária para o bebê que estava a caminho. “Ele teve de tudo e a filha dela, que é a coisa mais linda na nossa vida, está com um ano e oito meses. O menino, de dois anos e quatro meses, agora está com o pai. Desde então, eu nunca mais deixei a minha filha sair sozinha e, se ela fazia algo de errado, era pelo buraco do portão”, comentou.
Durante a abstinência, a mãe conta que inclusive chegou a tirar o celular da jovem. “Eu encontrei mensagens, dizendo ‘espera ela dormir’ e então tirei o chip. Ultimamente, estava indo dormir lá pelas 2h, 3h e, quando ia na cama, minha filha estava lá. Se ela fugiu algum dia, foi questão de pouco tempo, porque eu não vi nada. No dia em que ela fugiu de casa, foi questão de meia hora que fui no bairro ao lado buscar minha mãe, que atualmente está com 99 anos”, explicou.
Neste período, a mãe ainda pediu a um pedreiro para monitorar a jovem e não a deixar sair de casa. “Isto foi dez dias antes de encontrarem o corpo dela. Quando cheguei, o pedreiro estava segurando a mão da pequena e comentou que a Joice falou que iria ao mercado, 15 minutinhos depois de eu sair de casa. Ela sumiu e nunca mais voltou. Deixei minha filha tranquila, lavando louça e não imaginava que isto fosse acontecer”, lamentou.
Antes do sumiço, a mãe também conta que a família levava as crianças para passear e frequentavam a igreja. “Minha filha louvava desde os três anos, era a coisa mais linda do mundo. Infelizmente ela morreu assim. Foi na igreja inclusive que ela conheceu um homem que estava viúvo há dois anos. Eles deram um vacilo, ela era jovem e fértil e ficou grávida novamente. Mas, o pai ajuda em tudo. O problema era outro mesmo, a droga começou quando ela tinha 16 anos mais ou menos”, falou.
Falso crime
Na adolescência, ainda de acordo com a mãe, Joice chegou a inventar um cárcere privado e a mãe estava prestes a ir para a cadeia, quando houve a confissão. “Acho que ofereceram para ela na porta do colégio, são más companhias mesmo. Aliás, eu já perdi cinco pessoas na família por conta de drogas. Em uma destas vezes, se juntou com uma colega e ligou na delegacia de menor, dando detalhes e dizendo que eu estava mantendo ela em cárcere há cinco dias”, afirmou.
No outro dia, a menina pegou a bicicleta e foi para a escola. “Era sempre assim. Se estivesse sol, ela ia de bicicleta. Se estivesse chovendo, eu levava de carro. Ela foi e eu estava terminando de arrumar o quarto dela, quando tocou a campainha em casa. Fui atender e encontrei policiais armados, além de um delegado. Eles perguntaram por ela, falei que estava na escola, mas, ela já tinha sumido. Os policiais entraram e vistoriaram tudo, o quarto dela sempre foi arrumadinho, com o computador dela e tudo mais”, comentou.
A investigação já tinha verificado queixas de desaparecimento da menina, todas registradas pela mãe. “Eles nem imaginavam o quanto eu já tinha sofrido. Foram diversas vezes em que ela se escondeu dentro do banheiro e pedia para avisar quando eu fosse embora da porta da escola. Em seguida, já corria para as drogas. Ela estudou somente até a 7ª série. Eu, que nunca fiz mal nem com animal, tive a polícia armada na minha casa. No mesmo dia, tive de prestar depoimento”, relembrou.
O fato ocorreu no ano de 2016 e a mãe afirma lembrar de todos os detalhes. “Ela estava furiosa e os policiais acreditaram nela. Lembro até que alguém me disse: isto não é mãe, isto é um monstro. E eu a olhava, uma menina bonita e bem tratada, que nunca faltou nada. Até condições de pagar uma faculdade nós tínhamos, mas, ela nunca quis estudar. Depois, tivemos de ir em conselho tutelar, fazer exames de corpo de delito e, se tudo fosse comprovado, eu não estaria aqui e sim pagando uma pena de seis anos”, garantiu.
Ao chegar em casa, Joice foi confrontada pela costureira. “Meu marido foi até Tocantins trabalhar em rodovia para nos dar uma boa vida. Eu falei pra ela que não deveria mais fazer aquilo, que ainda pagaria um preço muito caro por tudo. Ela então colocou a mão na consciência e confessou a mentira para a polícia, quando um escrivão comentou. Só estava faltando um juiz assinar. Graças a Deus ela falou a verdade, dizendo novamente que foi na ideia das más companhias”, falou.
Agressividade
Já nos últimos dias, a mãe sentiu algo ruim acontecendo. “É triste tudo isto, foi um sofrimento. Agora penso que fiquei com a benção dos netos. Peço a Deus que dê o conforto no meu coração. Ainda estou sem chão, mas, vou continuar cuidando destas crianças com o maior carinho”, resumiu a mãe. Logo após a notícia, ela conta que um tio da jovem é quem foi fazer o reconhecimento.
Entenda o caso
A vítima foi encontrada em um terreno baldio na divisa dos bairros Santa Emília e São Conrado. Um morador que passava pelo local viu o corpo e chamou a polícia. Conforme o delegado, a suspeita é de que a mulher tenha sido morta na noite de domingo (13) em outro local e deixada onde foi encontrada. Não foram encontradas marcas de sangue no terreno. A polícia suspeita ainda que a vítima tenha sido amarrada antes de ser morta e não há indícios de reação. G1