Maria fazia faxina dia e noite, mas leva a culpa pela prisão dos 2 filhos

Na fila, a espera por uma senha que a coloque na frente do filho, depois de tanto tempo sem vê-lo. (Foto: Marina Pacheco)

Mesmo assim, na fila do presídio, ela é a única da família e mostra que mãe é sempre a última a desistir

Domingo de manhã. Como todo início de semana na porta do Instituto Penal de Campo Grande, mulheres começam a se aglomerar, seja Dia das Mães, seja Dia dos Pais, ou qualquer outro domingo do ano. Carregadas de sacolas, elas chegam de madrugada e dois detalhes chamam atenção na fila: não há homens esperando para entrar e sempre que alguém alheio ao contexto do lugar aparece, a primeira reação delas é erguir a cabeça, como demostração de que não há motivo para se envergonhar de mais um dia na porta do presídio.

Maria é uma dentre milhares de mulheres pelo Brasil que enfrentam horas de viagem para chegar até o seu destino e “cumpre” pena junto com o filho.

Encarregada de serviços gerais, Maria Auxiliadora Teodoro de Souza, tem 57 anos, e encara essa situação há 12. Começou quando o filho mais velho foi preso por uma briga. Depois veio a prisão do caçula, condenado por tráfico de drogas e envolvimento com furtos. Há cinco anos o filho mais velho morreu assassinado, mas a rotina de presídio continua pelo filho mais novo.

“Ele saiu do prisão uma vez e não voltou. Ficou dois anos fora trabalhando, até que foi preso de novo. Agora ninguém sabe quando ele vai sair”, conta Maria.

ali dentro. Se ela chega bem cedo, consegue sair por volta das 13h, mas se a chance de entrar só acontece a tarde, Maria fica até às 16h. “Lá dentro a gente almoça, conversa, faz oração. Porque agora graças a Deus ele está na igreja, parou de fumar…”, descreve. “Acho que ele está se encaminhando”.

Ela ainda lembra da primeira vez que teve contato com uma penitenciária. “Foi humilhante, ainda é uma humilhação. Uma dor que eu não desejo pra ninguém”. Da família, só ela visita o filho de 35 anos. “Tenho que vir, sou pai e mãe dele. Criei meus filhos sozinha”.

Maria é de Pernambuco e chegou a Mato Grosso do Sul por uma vida melhor. “Não aguentava mais aquela escravidão, era uma vida difícil”. Hoje, ela trabalha registrada na construção civil e como diarista nos fins de semana. “Pra conseguir comprar as coisas pra ele no começo do mês”.

O salário que ganha custeia as compras para o filho, ajuda os netos e quita as contas básicas de casa. Mas para ela, nem é o gasto excessivo a maior indignação. “É lembrar de tudo que a gente ouve”, afirma. “Tem gente que diz que eles foram presos porque eu não dei educação, mas penso: como? Eles estudavam enquanto eu trabalhava, fazia faxina dia e noite pra dar tudo a eles. Mas se bandearam para o outro lado”. protesta. Mas a persistência é necessária. “Porque só eu venho. Se depender dos outros, ninguém vem”.

Ainda do lado de fora, um dos netos, de 9 anos, chega na porta do presídio para pegar um dinheiro com a avó. “Dou um pouquinho para a mãe comprar o leite para as crianças”. Maria repassa o valor e um presentinho para o filho pequeno da ex-nora. “São meus netos, não posso abandonar”, justifica enquanto se despede do neto, cuida as sacolas e a fila.

Durante a entrevista, a maioria das mulheres que observam Maria escondem o rosto e pedem para não serem fotografadas. Porque do lado de fora, também tornam-se suspeitas. “Acham que porque temos um filho preso, a gente não presta”.

Maria não dá ouvidos e resiste. Mesmo que o Dia das Mães não faça mais sentido. “É um dia como outro da semana, não tem comemoração. Só peço para que meu filho não morra lá dentro”.

Como manter a rotina de visita não é fácil para o bolso, Maria até diz que vai desistir se o filho voltar à prisão depois de cumprir a pena. “Eu já falei pra ele que lavo minhas mãos, nunca mais volto aqui”. Mas não é preciso questionar duas vezes para ela voltar no assunto. “Eu falo assim, mas não é verdade. Mãe não sabe desistir de um filho”, finaliza. Campo Grande News

 

Compartilhe:
Posted in Noticias and tagged .

Deixe um comentário