Unicef e Facebook criam robô que conversa sobre ‘pornô de vingança’ para ajudar vítimas

Perfil de um robô criado por Unicef e Facebook para conversar com jovens sobre compartilhamento de imagens íntimas sem consentimento. (Foto: Reprodução/Facebook)

Parceria entre rede social e braço da ONU para crianças e adolescentes tenta ajudar jovens que foram alvo de compartilhamento sem consentimento de imagens íntimas.

Facebook e Unicef lançaram nesta segunda-feira (19) uma parceria para ajudar adolescentes que tiveram vídeos ou fotos íntimas expostas na internet, ou seja, foram alvos da chamada pornografia de vingança.

A rede social e o braço da ONU para criança e adolescente criaram um robô que usa o Messenger para conversar sobre o compartilhamento de imagens íntimas sem consentimento.

Para facilitar a conexão com adolescentes, as duas organizações deram rosto e nome para o robô: Fabi Grossi. Ela também é uma adolescente e tem uma história para contar: aos 21 anos, acabou de descobrir que o ex-namorado, com quem se relacionou por dois anos, vazou um vídeo íntimo dos dois. Assim como muitos jovens, ela:

  • fala gírias;
  • manda áudios (a narrativa de como ela soube do vazamento é feita assim);
  • envia selfies (feitas no espelho do elevador mesmo);
  • e tira fotos do que está vendo para explicar melhor um ponto.

Para dar cara e voz reais a ela, as organizações contrataram uma atriz. Do ponto de vista técnico, Fabi é um “chatbot”, um robô que usa serviços de mensagens para conversar com pessoas. Seu roteiro permite que ela bata papo durante 48 horas.

Roteiro de série

As falas dela foram desenhadas pela Sherpas, uma empresa argentina que desenvolve assistentes virtuais. “A estrutura do roteiro [da Fabi] é a mesma de um seriado”, diz Nicolas Ferrario, cofundador da Sherpas. “Só que isso aqui não é um filme, uma novela da Globo. É uma conversa. Não é a Netflix em que você simplesmente assiste. Você fala com ela. E pode até dizer, ‘Você mereceu’.”

Apesar de ser programada para desabafar sobre o que acabou de descobrir, Fabi também está lá para ouvir e reagir a isso:

  • Se percebe que está falando com uma vítima de pornografia de vingança, ela passa a falar menos de si e tenta entender em como pode ajudar;
  • Se o interlocutor for alguém que ache que ela não se protegeu o suficiente e foi exposta por isso, passa a explicar porque é vítima e não descuidada;
  • Se nota que do outro lado está alguém que já vazou conteúdo íntimo, Fabi explica como isso é nocivo e que ele pode ser responsabilizado judicialmente.

Sexting

A todos, ela dá dicas de como se precaver para que suas imagens íntimas não caiam na boca do povo da internet. E também orienta sobre como buscar orientação.

 “A gente não fala que ‘sexting’ (troca de nudes) é errado. Só que o adolescente não vê o risco de vazar o vídeo de alguém para os amigos. A nossa função é falar, ‘Cara, a Fabi pode ser sua namorada, poderia ser você, você pode até ir para cadeia se fizer isso’”, diz Ferrario.

Se esquecerem dela, Fabi o chama de volta para conversar e tenta mudar de assunto. “A gente também trabalha com o empoderamento dessas meninas, para que elas entendam que a vida dela não acaba se um vídeo for vazado.”

Ao longo do papo, Fabi faz algumas perguntas para entender com quem está falando. Quer saber dados pessoais, como idade, ou se está conversando com alguém que já fez vazamentos.

Tudo isso é usado pela Unicef para calibrar a ferramenta ou criar novas ações. Segundo a organização, a coleta de dados não informa quais usuários deram aquela informação.

Desafio duplo

“Por meio dessa experiência, o adolescente vai ter contato com o tema e se sensibilizar”, diz Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil. “A ferramenta permite engajamento um a um, porque você não pode ter uma pessoa atendendo todos os adolescente 24 horas por dia.”

Segundo ela, o Brasil é o primeiro país em que a Unicef recorre a um chatbot para discutir um tema tão sensível com jovens. “Quem trabalha com crianças e adolescentes enfrenta esse desafio: como chegar a eles com a informação de que precisam”, diz. Com a Fabi, acrescenta, “o adolescente vai entrar em contato com um robô em uma plataforma em que está acostumado”.

Dados da Unicef mostram que a maioria dos jovens no mundo está na internet, o que não ocorre com o restante da população. Entre pessoas com idade entre 15 e 24 anos, 78% estão na internet. Já quando todas as faixas etárias são consideradas, a taxa de conexão é de 48%. “Temos esse duplo desafio: de um lado, maximizar as oportunidades que a internet traz e, de outro, protegê-los dos riscos do uso não supervisionado”, diz Bauer.

Por isso, conta ela, a Unicef já discute internamente usar chatbots para tratar de temas como gravidez na adolescência, HIV e crianças fora da escola no Brasil e em outros países, como a Argentina. A Sherpas também já está trabalhando em fazer Fabi falar espanhol e inglês, com vistas a levá-la a conversar com jovens de outros lugares. G1

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