A vida é dura. Mesmo para quem já levou a chamada vida fácil. O caso de nossa personagem de hoje, cujo nome pediu para ser preservado, é uma história real. Pelo menos é o que essa senhora com seus mais de 50 anos garante.
Ela conta que foi uma jovem de beleza exuberante e um dia surgiu a oportunidade de um emprego para ganhar bem em São Paulo.
Um homem galante, bem falastrão, aproximou-se dela durante um baile no Máximo, ali pelos anos 80, e fez a proposta tentadora. Iria ganhar dez vezes mais do que com o pequeno salário que ganhava como empregada doméstica aqui em Cassilândia.
Não pensou duas vezes. Pegou as poucas roupas e calçados que possuía e rumou-se para São Paulo com o desconhecido.
Ficou enamorada dele e poucos dias depois os papéis se inverteram. Ele passou à condição de rígido e maldoso cafetão e ela, quando foi perceber, havia virado meretriz, inclusive morando num hotelzinho no Bairro do Brás, no centro de São Paulo, uma verdadeira boca do lixo naquela época.
Cerca de dois meses depois, continua ela contando, tirou o passaporte e viajou para a Espanha, onde foi entregue a um espanhol de longa barba e costeleta marcante, que tinha o apelido de “Dom Chacal”.
Na Espanha, o padrão de vida melhorou e passou a ganhar muitas pesetas, a moeda anterior ao euro, segundo lembra a nossa personagem.
Por ser muito desejada, com volumosas ancas, seios fartos, era cobiçada até por gente do governo espanhol, empresários, artistas famosos de toda a Europa, chegando até a dançar na noite de Paris, na França, em Turim, na Itália, e, como num conto de fadas, conheceu Tóquio, onde também exercia dois papéis muito claros e estabelecidos por “Dom Chacal”: a dança e a prostituição.
Só que a vida da prostituta, lembra ela, “tem prazo de validade”.
– E o meu já estava vencendo, pois havia passado dos 35 anos, os seios começaram a cair, surgiram as tais varizes, o tchauzinho do braço e, assim, os clientes foram desaparecendo, o meu corpo já estava decadente depois de vários abortos, cinco ou seis, não me lembro bem, cirurgias plásticas mal feitas e drogas, muitas drogas – conta a senhora que hoje é idosa e mora em Cassilândia.
A personagem conta que foi jogada na rua, ali na boca do lixo de Madrid, onde passou fome, sede e frio.
Um dia conheceu um espanhol piedoso, chamado Enrico, que lhe trouxe para o Brasil.
Mas, quando tudo parecia bem, aconteceu uma tragédia. O espanhol, que falava poucas palavras em Português, foi assaltado por dois ladrões em Santos, esfaqueado e morto numa madrugada fria de junho de 2001.
– Tudo que ganhei na prostituição, uma boa casa, carros e até um título de nobreza, ficou para trás. Queimei tudo usando drogas de todos os tipos: cocaína, heroína, maconha. Tudo que aparecia eu usava e o dinheiro foi sumindo. Um dia o traficante tomou a minha casa. Os carros também viraram pó. E o título de nobreza, que me dava acesso à alta sociedade de Madrid, não passa hoje de um registro na minha memória.
Assim, a nossa personagem pediu a oportunidade para escrever a sua história com uma justificativa. “Quero que todas as jovens de Cassilândia, ao tomarem conhecimento de minha vida trágica, aprendam a lição. Não se deixem nunca levar pelo elogio fácil, porque a beleza é passageira, a carcaça enferruja, os seios desabam, os homens que antes lhe desejavam hoje nem olham para você ou se olham fingem que não lhe veem. A vida é dura e pune quem não sabe viver. Aprendam isso, pelo amor de Deus! Aprendam isso, pelo amor de Deus!”
E assim termina a crônica de hoje.
CORINO ALVARENGA