Stephen Hawking deixou um legado que transcende a academia, de livros que se tornaram best-sellers a um filme sobre sua trajetória indicado ao Oscar.
A paixão do físico britânico pela ciência e por desvendar os segredos do Universo despertou curiosidade sobre o cosmos em milhões de pessoas ao redor do mundo.
Stephen Hawking, físico britânico, morre aos 76 anos
Em 2010, a jornalista americana Diane Sawyer, da ABC World News, perguntou a Hawking que conselhos ele daria a seus filhos. E uma das respostas foi:
“O trabalho proporciona significado e propósito, e a vida é vazia sem isso.”
Mas será que essa filosofia em relação ao trabalho pode se aplicar a todo mundo? A vida fica realmente vazia sem um emprego que não apenas pague as contas, mas também propicie realização e satisfação pessoal?
“Se você ama o que faz, os pequenos problemas que aparecem não te afetam nem fazem você desistir. É bom para o indivíduo e para a organização”, avalia Sally Maitlis, professora de comportamento organizacional e liderança na Universidade de Oxford, no Reino Unido.
“Mas pode ser prejudicial se você ama a ponto de (o trabalho) ser absolutamente essencial para a forma como você entende a si mesmo e a sua contribuição para o mundo”, adverte.
Maitlis explorou esse conceito, no ano passado, em parceria com Kira Schabram, professora de administração na Universidade de Washington. Elas fizeram um estudo com 50 pessoas que trabalhavam em abrigos de animais na América do Norte, atraídos para o emprego por causa do amor de infância pelos animais ou pela crença de que tinham as habilidades necessárias para fazer a diferença.
Como resultado, eles acumulavam horas extras, se ofereciam para turnos difíceis e invariavelmente resolviam problemas. Mas, no fim das contas, se sentiam estafados ou frustrados. Não era raro se depararem com a eutanásia de animais ou terem que lidar com a dura realidade dos recursos escassos, além da má gestão que rondava muitos abrigos. Uma parte acabava desistindo.
Ainda assim, Maitlis e outros especialistas concordam que escolher uma carreira com propósito tem, sem dúvida, efeitos positivos.
Em fevereiro, a Associação Americana de Psicologia publicou um artigo que resume as descobertas desse campo desde 1993. Um estudo da professora Teresa Amabile, da Universidade de Harvard, mostrou que “não importa o tamanho do objetivo – encontrar a cura do câncer ou ajudar um colega -, ter um senso de significado e uma sensação de progresso podem contribuir para a felicidade no local de trabalho”.
Mas encontrar um emprego com propósito pode ser uma tarefa difícil para muita gente.
Anat Lechner, professora de administração da Universidade de Nova York, diz que é simplesmente uma questão de estar ciente do que você gosta de fazer. É quando você está tão entusiasmado com algo, que é difícil distinguir o trabalho real de um hobby ou passatempo.
“Você não pode separar Elon Musk de tudo o que ele está construindo”, compara.
Em outras palavras, são atividades com as quais você tem uma afinidade natural – e poderia desempenhar apenas por prazer fora do horário do expediente.
Porém, embora muitas pessoas consigam identificar esses interesses, acabam não investindo em suas verdadeiras paixões na hora de construir uma carreira.
“Preferem ir trabalhar no (banco de investimentos) J.P. Morgan porque acham que é uma aposta segura”, afirma Lechner. “E deixam de fazer coisas em que, de outro modo, poderiam prosperar, crescer e agregar valor, e o mundo poderia retribuir de uma maneira positiva.”
Amy Wrzesniewski, professora de comportamento organizacional na Universidade de Yale, sugere uma técnica chamada “job crafting”, que consiste em identificar as partes de que você gosta no seu trabalho atual, para em seguida transformar em algo mais gratificante como um todo.
Esse exercício pode ser útil para quem conseguiu o emprego dos sonhos, mas viu que não correspondia às expectativas – como os funcionários do abrigo de animais analisados no estudo de Maitlis e Schabram.
“Existe alguma maneira de se envolver com música, ou seja lá o que for, que te permita se conectar com os elementos (do trabalho) que são mais significativos, em vez de se basear apenas na definição da sua função?”, questiona Wrzesniewski.
Alguns empregados do abrigo, por exemplo, fizeram isso e buscaram outras ocupações também centradas em animais, como adestramento e treinamento.
Wrzesniewski alerta ainda para as visões de mundo autossabotadoras, que impedem as pessoas de encontrar o que realmente gostam.
“(Há quem pense que) você tem que descobrir isso, quase como se fosse uma identidade concreta que habita no mundo e você precisa revirar diversas pedras para encontrar”, diz.
“Isso pode gerar uma tonelada de ansiedade.”
Em vez disso, o processo pode ser mais experimental: de tentativa e erro.
Focar no que você ama é a chave para combinar carreira e identidade. Ou seja, permite que o seu trabalho tenha mais significado e propósito – além de pagar as contas e fazer você crescer profissionalmente.
“Quando você está tão imerso no que faz, você se torna aquilo”, afirma Lechner. “Eu acho que Hawking tinha isso.”
G1