Empresas que trabalharam para o PT nas últimas campanhas eleitorais cobram judicialmente ao menos R$ 46 milhões em dívidas do partido.
A Folha localizou 24 processos contra o partido na Justiça paulista. A maior parte tem como alvo da cobrança o diretório estadual da legenda de São Paulo.
Entre os credores, há empresas de marketing político, gráficas, produtoras, fornecedores de material promocional, um escritório de advocacia e até uma prestadora de serviços contábeis.
Mais um obstáculo nos planos eleitorais do PT em 2018, as dívidas começaram a se multiplicar em 2014, ano de deflagração da Operação Lava Jato.
As principais empreiteiras do país, patrocinadoras tradicionais de campanhas, foram atingidas pelas investigações. Em troca de contratos superfaturados, distribuíam propinas e alimentavam os principais partidos políticos com doações volumosas.
Em 2015, no desdobramento da Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal proibiu o financiamento empresarial. Desde então, as únicas fontes legais são as contribuições de pessoas físicas e os repasses do fundo partidário, financiado por verba pública.
Em 2017, o PT recebeu R$ 88,4 milhões em duodécimos do fundo partidário. A dívida cobrada na Justiça de São Paulo representa cerca de 52% desse valor.
A Diorsi Comércio de Brindes, por exemplo, foi contratada por R$ 906,2 mil na campanha de 2014 para fornecer material publicitário, como bandeiras e estandartes.
A mercadoria, porém, não foi paga e a empresa alega que, por conta disso, ficou em precária situação econômica, tendo de paralisar suas atividades em 2015. Considerando o valor atualizado da dívida e os juros legais, a Diorsi cobra R$ 1,507 milhão do PT.
O partido não nega ter adquirido os produtos da empresa, mas, na petição em que pede a extinção da ação, faz questão de dizer que a contratação foi “verbal”.
Afirma também que os pagamentos ocorreriam ao longo de quatro anos, “conforme a possibilidade financeira e sem acréscimo de juros ou correção monetária”. Diz que já pagou parte do valor.
Outra empresa que cobra o PT na Justiça é a Digital Polis, contratada em 2014 por R$ 4 milhões para criar e manter uma página na internet para Alexandre Padilha, então candidato ao governo.
A última parcela do compromisso deveria ter sido quitada no dia 4 de outubro de 2014. O pagamento, porém, diz a empresa, não ocorreu.
DÍVIDAS DE CAMPANHAS DO PT
As maiores cobranças que prestadores de serviço fazem ao partido na Justiça em SP, em R$
FG Marketing Eleitoral Spe Ltda
20.018.971,18
VG Marketing Eleitoral Ltda
6.428.397,15
F5BI Produções Ltda
2.662.622,45
VTPB – Serviços Gráficos e Mídia Exterior Ltda (EPP)
2.531.201,21
Digital Polis Propaganda e Martketing Ltda
2.450.000,00
DNB Comércio de Serviços De Materiais Promocionais Eireli
1.868.036,39
Gesso Art Designer Ltda (EPP) (Direitos cedidos pela Núcleo Graf Gráfica, Editora & Assessoria Eireli)
1.631.913,97
Diorsi Comércio de Brindes e Material Publicitário e Vestuário Ltda
1.507.169,35
Rede Seg Gráfica e Editora Eireli (EPP)
1.233.519,37
Analítica Amaral & Associados
868.351,82
Braian Storm Serviços De Impressão Ltda
830.365,44
Braian Storm Serviços De Impressão Ltda
751.947,86
Mar Mar Gráfica e Editora Ltda
674.408,31
R$ 46,36 milhões
Total de 24 dívidas de campanha cobradas judicialmente do PT
*Valor definido pela Justiça (1ª instância)
A Digital diz que, em consequência desse fato, passa por dificuldades e não tem condições, sequer, de pagar as custas processuais. A dívida com a empresa estaria na casa dos R$ 2,4 milhões.
Uma das sócias da Digital é Alice Requião, enteada do marqueteiro João Santana, que fez as campanhas presidenciais de Lula e Dilma Rousseff e hoje tem um acordo de delação premiada com o Ministério Público.
Na ação em que a dívida é cobrada, o PT declara que, em razão das novas regras de financiamento das campanhas eleitorais, “a obrigação se tornou excessivamente onerosa” e pede a “alteração de seus parâmetros”.
Nos processos localizados pela Folha, a FG Marketing é a maior credora do partido.
Responsável pela concepção estratégica e a criação publicitária da campanha de Padilha de 2014, entrou com uma ação dois anos depois cobrando R$ 20,02 milhões.
Em acordo homologado na Justiça, o PT se se prontificou a repassar mensalmente à empresa 30,2% do fundo partidário pertencente ao diretório estadual. Em novembro, isso significou R$ 124,6 mil.
Derrotado na campanha de reeleição em 2016 e cotado como alternativa do PT ao Planalto neste ano, Fernando Haddad publicou um vídeo na internet pedindo doações para quitar dívidas que totalizavam R$ 8,58 milhões.
“A eleição acabou, mas a campanha não”, afirmou. “Temos ainda alguns profissionais que precisam receber, conto com sua colaboração para virar essa página.”
De lá para cá, porém, o partido quitou só 33% do valor. O PT municipal tem promovido jantares para arrecadar recursos, bem como feito gestão pedindo socorro às instâncias superiores do PT.
Cansada de esperar, a Mar Mar Gráfica entrou com ação em fevereiro. Diz que o partido não honrou acordo no qual, para “solucionar amigavelmente o problema”, a empresa abria mão de cobrar juros e correção monetária. Exige agora multa de 10% e juros, o que totaliza um valor de R$ 674,6 mil.
O diretório municipal diz em nota que a projeção de pagamento dos credores é de 45 meses. “Claro que o partido depende de fatores externos para cumprir essa previsão.”
OUTRO LADO
Procurado pela Folha, o diretório estadual do PT de São Paulo limitou-se a dizer que “as prestações de contas do PT são públicas e estão disponíveis no site do TRE”.
À Justiça o diretório justificou as dívidas com a mudança do entendimento legal, em 2015, a partir da qual, passou a ser proibido financiamento empresarial das campanhas. “Esses recursos representavam, objetivamente, grande parte do financiamento das campanhas eleitorais”, disse o partido, em um dos processos. “Mas as coisas mudaram substancialmente desde então, e sem modulação dos efeitos”.
O diretório municipal, dirigido por Paulo Fiorilo, afirmou que projeção do pagamento de todos credores de campanha de Fernando Haddad é de 45 meses. “Claro que o partido depende de fatores externos para cumprir essa previsão”, diz.
“O PT, apesar das dívidas assumidas, não considera que a situação do Diretório Municipal é grave. O Diretório Municipal consegue realizar o pagamento dos seus funcionários e as despesas ordinárias de sua sede.” Folha de S. Paulo